A Eletrecidade Estática em Ambientes Potencialmente Explosivos
A ELETRICIDADE ESTÁTICA EM AMBIENTES POTENCIALMENTE EXPLOSIVOS.
Tudo o que nos rodeia possui energia. Sim, energia, mesmo que não seja identificada a olho nu, ou sentida diretamente como quando encostamos em um condutor energizado.
Porém, fato é que desde quando criança realizamos experiências nas escolas demonstrando a interação entre dois corpos, aprendemos que toda matéria possui átomos, e neste temos os prótons, elétrons e nêutrons.
Para entendermos melhor a eletricidade estática precisamos compreender como este fenômeno acontece.
O atrito entre dois corpos gera a troca de elétrons destes átomos, mantendo um dos corpos que estava neutro, com excesso de carga elétrica. Até este momento é possível imaginarmos perfeitamente diversos acontecimentos que demonstram com clareza a presença da eletricidade estática, tal como o atrito de uma bexiga cheia no cabelo, e logo em seguida, a bexiga consegue "atrair" pequenos pedaços de papéis picados que estariam sob a mesa.
A superfície da bexiga ao ser atritada com o cabelo, acumula um excesso de carga. Ao aproximarmos a bexiga dos papéis picados, que estão neutros ou com carga inferior a da superfície da bexiga, estes tendem a se neutralizarem, e com isto ocorre a troca de cargas. No momento da troca de cargas os papéis que possuem densidades muito pequenas, são atraídos para a superfície da bexiga junto com suas cargas, causando o efeito de atração que podemos enxergar a olho nu.
É possível aprofundar ainda mais o conhecimento sobre a eletricidade estática, e compreender como os materiais se comportam com suas propriedades características que definem se as cargas acumuladas serão positivas ou negativas. A tabela triboelétrica possui dados que contribuem para a melhor compreensão deste fenômeno:
Neste caso, ao atritarmos vidro com a lã, o vidro ficará com escassez de carga negativa (positivo) e a lã ficará com excesso de cargas negativas (negativo).
É possível verificarmos a presença da eletricidade estática em diversas tarefas do nosso cotidiano, tais como:
Caminhar sob um carpete com meias: Acumulamos de 1.500 a 35.000 Volts
Caminhar sob um piso de vinil sem tratamento: Acumulamos de 250 a 12.000 Volts
Sentar em uma cadeira com estofamento de vinil: Acumulamos de 700 a 6.000 Volts
Utilizar um simples envelope plástico comum: Acumulamos de 600 a 7.000 Volts
Ou seja, é difícil de acreditar que acumulamos esta enorme quantidade de Volts ao manusearmos ou nos locomovermos realizando tarefas simples do dia-a-dia.
Porém, mesmo com estes números impressionantes, é importante destacar que não ocorrem acidentes com mortes por eletroplessão (comumente confundido com eletrocussão) envolvendo a eletricidade estática, pois a descarga ocorre de forma rápida e com uma quantidade de corrente elétrica na escala de mili ampéres.
No entanto, a eletricidade estática é tão perigosa quanto a eletricidade que conhecemos.
Sabemos que toda matéria possui energia, e que o atrito entre matérias causa o acúmulo desta energia que pode ser positiva ou negativa dependendo do material em que está sendo atritado. Mas isto ocorre apenas com materiais no estado sólido?
Como sabemos, a matéria pode estar no estado sólido (ou particulado), líquido ou gasoso, e toda matéria quando entra em atrito com outra gera a troca de cargas, portanto:
A água quando é transportada também gera ou retém cargas elétricas mediante ao atrito do líquidos com as superfícies sólidas.
O carro ao percorrer longos percursos em um rodovia, está em freqüente atrito com o ar, e isto também causa a retenção de cargas elétricas.
Portanto, entraremos no principal assunto desta matéria: Em ambientes de trabalho, estaremos em freqüente contato com diversos materiais em diferentes estados de matéria, gerando portanto, eletricidade estática. Mas se não há mortes por eletroplessão mediante a descarga da eletrostática, então por que deveremos nos preocupar?
Ao realizarmos a descarga de um corpo eletricamente carregado geramos um arco elétrico, que ocorre mediante ao excesso de cargas elétricas que estão passando de um ponto para o outro, quebrando a rigidez dielétrica do ar naquele momento, causada por um diferencial de potencial entre o corpo carregado e o corpo neutralizado ou aterrado.
Ou seja, nós poderemos provocar uma centelha se estivermos com uma grande concentração de tensão elétrica, causada pelo atrito com diversos tipos de matérias, tais como um casaco de seda, um assento de vinil ou até mesmo ter viajado com os vidros abertos.
Esta descarga é rápida e inofensiva para o homem, a menos que ele esteja trabalhando em um ambiente potencialmente explosivo, como refinaria de petróleo, indústrias químicas, empresas de armazenamento de gases e até mesmo frentista de posto de combustível.
Direto ao assunto
Ambientes potencialmente explosivos pertencem aos grandes ramos industriais responsáveis por movimentar grande parte da economia mundial. Estes ambientes possuem grandes instalações e a maioria delas contemplam áreas que demandam o triplo de atenção dos técnicos, gestores, engenheiros e diretores industriais: As áreas classificadas.
A abordagem do tema tem como objetivo principal veicular o máximo de informações importantes para a conscientização da segurança em eletricidade estática em ambientes potencialmente explosivos.
Sabendo que a descarga elétrica causada pelo acúmulo de energia estática demonstra uma ameaça ao triângulo do fogo como fator ignitor, devemos compreender de uma forma melhor seus princípios e comportamentos em ambientes explosivos.
Vamos aos cálculos.
Sabendo que a retenção da eletricidade é um fator crucial para compreendermos os caminhos da descarga eletrostática, consideremos que:
Portanto, caso tenhamos uma condição com um comprimento de 1 metro, o tempo de dissipação seria de 18 segundos. Já para uma condição com comprimento de 1000 metros, o tempo cai para 0,018 segundos. Ou seja, quanto maior a superfície que adquire a carga for, menor é o tempo de dissipação desta energia. Entende-se que em uma matéria com grande extensão, as cargas tendem a se espalharem, e isto facilita sua dissipação em função do curto período de tempo.
Mediante a estes estudos, a engenharia de modo geral chegou a conclusões interessantes quando se tratam de líquidos inflamáveis:
Ações para minimizar a geração de acúmulo de cargas: Limitar a velocidade dos líquidos inflamáveis, quando bombeados em sistemas abertos, para velocidade máxima de 7m/s. Deste modo minimizaria a geração de cargas eletrostáticas no líquido inflamável.
Ações para retenção de cargas na superfície: Aterramento. Apenas o aterramento das estruturas conseguiria realizar a dissipação imediata das cargas eletrostáticas.
Deve-se eliminar a descontinuidade dos condutores. Isto mesmo, quanto maior for a continuidade do condutor, melhor, pois conforme a tabela dos exemplos acima, com 1000 metros de condutividade alcançamos apenas 0,018 segundos para que a energia fosse dissipada. Já se este condutor fosse de apenas 1 metro, esta dissipação duraria 18 segundos aproximadamente, tempo suficiente para entrar em algum limite de explosividade.
Deve-se também eliminar condutores isolantes. Parece incoerente, mas a borracha possui alto índice de retenção de cargas, sendo portanto uma ameaça quando se trata de eletricidade estática, pois ela impacta diretamente no tempo de dissipação da energia.
Analisando os dados alcançados por cientistas, conclui-se que fica inviável limitar o bombeamento de combustíveis a apenas 7 m/s, isto causaria um atraso na produção e deslocamento do produto e acarretaria em prejuízos.
Então, para que não nos limitemos à esta velocidade de bombeamento, devemos aplicar as demais ações e estar sempre inspecionando para garantir a boa dissipação da eletricidade estática acumulada através do movimento dos fluidos inflamáveis.
Os particulados (grãos e fibras) também devem possuir amplo espaço na discussão do tema. O simples fato de escoar grãos em funis metálicos pode causar o acúmulo de mais de 25.000 Volts.
Visto que o acúmulo de tensão em escala de kV causa um grande risco de ignição de um ambiente potencialmente explosivo, sendo ele de líquidos inflamáveis, gases e vapores ou poeiras e fibras, a engenharia evolui grandiosamente nos métodos de mitigação destes riscos, embora este assunto ainda seja desconhecido por grandes produtos e indústrias ao redor do Brasil.
A engenharia mitigando os riscos
Expostos os conceitos e riscos causados pela eletricidade estática, a engenharia tem feito seu dever de casa garantindo equipamentos de qualidade para o controle dos riscos supracitados, e buscando a mitigação dos mesmos.
Conforme mencionado, a simples exposição de um caminhão de combustível em trajeto ao seu destino de abastecimento, é suficiente para um grande acúmulo de eletricidade estática em sua lataria. Antigamente, eram adotados correntes dependuradas aos caminhões no intuito de, ao longo da viagem, realizarem a descarga elétrica destas cargas. Contudo, a prática poderia até ser eficaz, porém não se podia garantir a ausência da eletricidade no momento da retirada da mangueira para o abastecimento.
Outra prática muito eficaz era a de solicitar ao motorista e operador, que aguardasse alguns minutos antes de realizar o abastecimento do local. Normalmente o tempo de ir na loja de conveniência e tomar um "cafézinho" já seria o suficiente para que esta carga fosse dissipada (lembram-se da tabela de tempo em segundos já mencionada?)
Pois é, porém estes métodos não são confiáveis... Atualmente existem fabricantes que possuem equipamentos de alta tecnologia que realizam a descarga elétrica desta carga acumulada e acionam através de alarmes sonoros e visuais demonstrando ao operador que o caminhão está pronto para realizar o abastecimento com segurança.
Esta preocupação deve ocorrer também em ambientes potencialmente explosivos industriais, tais como refinarias, plataformas e análogos.
As estruturas metálicas dentro destes ambientes são totalmente aterradas, e isto acaba permitindo a presença de uma grande diferença de potencial em relação a estrutura para com o operador.
Ao operar um painel, o operador pode estar carregado eletricamente e causar uma centelha ao tocar no equipamento. Isto normalmente pode ocorrer com painéis fabricados em poliéster com fibra de vidro comumente encontrados nestes ambientes.
Para operar ou adentrar em ambientes potencialmente explosivos, o ideal seria realizar uma descarga das cargas atmosféricas que por ventura ao longo do trajeto o operador pode ter acumulado.
A engenharia também se preocupa com este procedimento, e grandes empresas industrializam equipamentos que acompanham a necessidade do mercado.
Conclusão
Portanto, com a presença de gases, vapores, particulados combustíveis e análogos, não pode-se deixar que a sorte e o acaso cumpram seu papel e mantenham as coisas em condições normais. É preciso que estudos avançados sejam realizados para compreender cada vez mais os fenômenos que compõem as explosões.
A eletricidade já de ante-mão é uma aliada quando utilizada da forma correta. A eletricidade estática contudo, é além de invisível, muito perigosa, e através de um descuido todo o planejamento de segurança e mitigação de riscos pode ir por água a baixo.
A utilização de equipamentos tecnologicamente avançados tendem a manterem as áreas potencialmente explosivas ainda mais seguras, no entanto, apenas a disseminação das informações e qualificação profissional poderão limitar o índice de acidentes para menos de 1%.
Leonardo Freitas - Engenheiro Eletricista | Panzer Engenharia e Consultoria